Um pouco da história do Intercâmbio Ciência-Ficção Alex Raymond
Revistas de histórias em quadrinhos, agora raridades, são para os colecionadores um problema. Quem tem revistas antigas não dispõe delas de jeito nenhum. Entretanto, muitos têm duplicatas e trocam por outras que lhes faltam. Há também os comerciantes de revistas antigas. Então, reunindo esse pessoal todo, há revistas para todos. Para quem quer comprar, para quem quer vender e para quem quer trocar.
Foi pensando assim, que em 12 de outubro de 1965, Edson Rontani resolve fundar o Intercâmbio Ciência-Ficção Alex Raymond, a primeira entidade do gênero no Brasil. "Alex Raymond" em homenagem ao ás do desenho da década de 30, criador de Flash Gordon, Jim das Selvas, Agente Secreto X-9 e Rip Kirby (Nick Holmes para nós, brasileiro).
Foi difícil formar o Intercâmbio. Onde achar elemento humano ? Era ficção ... Colecionadores de outras partes do Brasil, onde ? O número de pessoas que colecionavam gibis era pequeno. Foi um tal de recorrer aos amigos, procurar nomes nos mercados de revistas, pegar nomes de leitores que escreviam cartas para as editoras (que eram publicadas nas revistas antigas), e muitas dessas pessoas já eram falecidas. Enfim, depois de árduo trabalho, muitas cartas retornando ao remetente, por mudança de endereço, ou falecimento do colecionador, mesmo assim, de início conseguimos 189 nomes de pessoas que se dedicam às histórias em quadrinhos, dentre elas desenhistas e argumentistas.
De mangas arregaçadas, com o pensamento firme de levar avante essa nossa iniciativa, o Intercâmbio Ciência-Ficção Alex Raymond tem em seus arquivos hoje nada menos que mil nomes de colecionadores cadastrados.
De início, lançamentos um boletim informativo e noticioso sobre HQs, de nominado FICÇÃo, n° 1 - outubro de 1965 (vide referência na contra-capa da revista Superman BI n° 6 de janeiro de 1966). Este boletim circulou em 14 números, de 1965 a 1972.
Em 1973, Edson Rontani resolveu editar uma coisa melhor e com maior número de páginas, editando uma revista denominada FANZINE, comentando todas as revistas vbrasileiras, em todoso os números e analisando herói por herói. A repercussão foi agradável.
Edson Rontani sempre foi e é até hoje um dos grandes entusiastas das histórias em quadrinhos. Seu nome consta na Enciclopédia COMICS, da "The Graphics Press", de Zurich, Suíça, e diversas outras publicações brasileiras e portuguesas.
Na década de 40 e início dos anos 50, Edson Rontani foi muito perseguido pelo clero. Depois de um trabalho seu sobre as histórias em quadrinhos no "Diário de Piracicaba", que tomava o espaço de quase meia página de cinco edições, os padres passaram a persegui-lo pois os gibis eram tomados como revistas do diabo, na década de 40 e início da de 50.
Fato curioso ocorreu com o sr. Edson Rontani, advogado, embora não exerça a profissão, no tempo de ginásio. Não era permitida sua presença nas aulas de religião que eram lecionadas por um padre na cidade de Piracicaba. O referido padre achava que os jovens podiam ler apenas a revista "O Jornalzinho", publicação católica editada pela Pia Sociedade de São Paulo.
Mas, eis que em meados da década de 50, "O Jornalzinho" , publicação necessariamente católica, passa a publicar histórias em quadrinhos de faroeste, puro "bang-bang" : "Steve Davson em luta contra o crime", "Cavaleiros da noite", com o polícia montada Tim Warren (história já publicadas em 1940 em livretos da "Biblioteca das Crianças", da Edições e Publicações Brasil Editora, de São Paulo), histórias esses tanto combatidas. E seguiram outras, "Homens sem Fronteiras", "O Vale da Morte", "Vingança Inútil", etc. etc.
Chegara a hora da desforra. Não cabia na pequena cabeça do jovem Edson Rontani, anteriormente ser dispensado, ou melhor, proibido de assistir as aulas de religião por divulgar as histórias em quadrinhos, agora a própria imprensa católica publicava aquelas histórias consideradas do diabo, do capeta, como diziam na época.
A justiça tarda mas não falta. O sr. Rontani tomou o trem da Cia. Paulista (ônibus naquele tempo nem se falava, pois novas estradas não eram asfaltadas), dirigiu-se até São Paulo, e na capital adquiriu, na Praça da Sé, diretamente da Pia. Sociedade S. Paulo, um lote de "O Jornalzinho". Retornando á Piracicaba, não houve dúvidas, mandou entregar um saco cheio de "O Jornalzinho" com a histórias em quadrinhos de faroeste, bang-bang, etc.
A história em quadrinhos desde o seu aparecimento, sofreu severas perseguições, entretanto, ela se impôs, já que destruí-la seria negar a verdade do desenvolvimento do mundo. A história em quadrinhos é um invento deste século. E como todos os inventos, têm sua oposição.
Através de uma história em quadrinhos, se pode elevar a moral de uma nação, como assim também elevar o valor cultural dos "povos que não têm tempo", e não se preocupam em aumentar seus conhecimentos culturais.
A ilustração ajuda a compreender. Nos Estados Unidos há muito tempo, os escolares e universitários já aprendiam mais histórias e outras matérias através de uma história em quadrinhos, do que áridos textos.
As histórias em quadrinhos não fazem mal nem fazem bem. Elas são nada mais que decorrência de uma época - tão lógicas e naturais neste século quanto um avião a jato cruzando os céus ou um aparelho de televisão em nossas casas.
Dize que a leitura de uma revistas de histórias em quadrinhos conduz à delinquência é uma conclusão apressada, que os fatos não afirmam. O caráter não se forma pela leitura, mas pelas condições de vida e pelo exemplo. Terá mau caráter a criança que não possuir um lar, que não receber carinhos e conviva ao léu, no seio de uma sociedade que lhe é feita de madastra. Num inquérito procedido na Cada de Correção de Porto Alegre sobre as condições de família dos deliqneutes, foi apurado o seguinte resultado, num total de 678 presidiários : sem pai 21,4%, sem mãe 10,3%, adotivos 18,2%, abandonados 13,6%, pais alcoólotras 12,5%, pais desajustados 8,1%, abrigo de menores 12,4%, lar aparentemente normal 3,5%. Total 100%.
N.E.: este texto foi originalmente escrito em máquina de escrever e impresso em mimeógrafo a álcool (o segundo de nosso Intercâmbio) nos anos 80 por Edson Rontani. O final não consta do texto original, mas promete que vasculhando meu arquivo encontrarei-o e colocarei a disposição de sua leitura aqui.
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